“Quando um país começa a legislar contra sua própria história, é sinal de que os interesses políticos falaram mais alto que os princípios.”
Com a aprovação definitiva do Decreto-Lei nº 36/2025, a Itália inaugura oficialmente um novo ciclo legislativo para o reconhecimento da cidadania por descendência. Embora revestido de formalidade jurídica, o texto tem sido duramente criticado por juristas, associações internacionais e parlamentares defensores do Estado de Direito. Para muitos, trata-se de uma norma superficial, de caráter eleitoreiro e desconectada da realidade jurídica e histórica do país.
O que foi modificado pelo Senado?
Durante a tramitação no Senado italiano, houve tentativas de suavização de alguns pontos mais radicais do texto original, graças à mobilização da diáspora, de especialistas e de parlamentares da oposição. A principal mudança diz respeito à redação que restringia o direito apenas a descendentes de italianos nascidos em território italiano.
Essa exigência foi substituída por uma formulação aparentemente mais branda, mas igualmente excludente: “ascendentes que tenham tido, até a morte, exclusivamente a cidadania italiana”. Na prática, essa alteração desconsidera a realidade histórica da imigração e continua penalizando milhares de famílias cujo ancestral se naturalizou no país de acolhimento, muitas vezes por exigência legal e não por escolha própria.
O que muda na prática?
O novo decreto impõe barreiras administrativas significativas ao reconhecimento da cidadania italiana, especialmente nas gerações mais distantes — como bisnetos e tataranetos. A justificativa oficial gira em torno de “controle migratório” e da pretensa necessidade de proteger a “italianidade real”, conceitos vagos e amplamente criticados por especialistas por violarem os princípios fundamentais da Constituição Italiana.
O trecho que exige exclusividade da cidadania italiana até a morte do ascendente representa, talvez, o ponto mais sensível e discriminatório da nova legislação. Ele ignora os contextos históricos de emigração forçada, desconsidera a integração cultural dos italianos nas Américas e transforma um direito de sangue em um privilégio burocrático.
Quem aprovou e quem votou contra?
Aprovado com o apoio da base governista, o decreto reflete uma retórica populista e xenófoba, ainda que velada, com o claro objetivo de dificultar o acesso de descendentes de italianos — sobretudo da América do Sul — à cidadania.
Por outro lado, a oposição foi formada por parlamentares e partidos comprometidos com o respeito à Constituição e à comunidade italiana no exterior. Votaram contra o decreto:
- Partito Democratico (PD)
- Movimento 5 Stelle (M5S)
- +Europa
- Alleanza Verdi e Sinistra
- Gruppo delle Autonomie (SVP-PATT)
- Parlamentares eleitos no exterior com histórico de defesa da cidadania
Esses representantes destacaram que o debate não gira em torno de filas ou burocracia consular, mas da preservação de um direito originário de milhões de famílias que descendem de italianos e mantêm viva essa identidade cultural em todos os continentes.
Qual o caminho a seguir?
Diante desse novo cenário, a Master Cidadania reafirma sua posição jurídica, baseada em décadas de jurisprudência: a via judicial permanece legítima, segura e amplamente aceita pelo Judiciário italiano — tanto para descendentes da linha materna quanto da linha paterna.
O que antes era uma tese constitucional consolidada para corrigir a injustiça de gênero imposta pela Lei de 1992 — que impedia mulheres de transmitir a cidadania — agora se aplica também aos descendentes da linha paterna, frente às novas e inconstitucionais restrições administrativas.
Estamos diante de um novo capítulo da luta pelos direitos civis, e o reposicionamento jurídico é claro: não se trata de buscar atalhos ou contestar filas consulares, mas de garantir um direito legítimo, transmitido pelo sangue e reconhecido pela história e pelos tribunais.
Um chamado à união
Aos milhares de italianos no exterior, especialmente na América do Sul, onde vivem milhões de descendentes com direito de voto, deixamos um convite sereno e firme: unam-se àqueles que verdadeiramente representam nossa história e identidade.
A cidadania italiana não é favor político nem presente institucional. É um direito inalienável, nascido do sangue, da cultura e da memória.